Contra a Homofobia: conquistas e desafios legais

O que o Brasil tem a comemorar neste 17 de maio, quando se celebra o Dia Internacional contra a Homofobia? Falemos de avanços nas políticas inclusivas e do que não podemos estar orgulhosos.

16 MAI 2016 · Leitura: min.
Contra a Homofobia: conquistas e desafios legais

Na semana em que se celebra o Dia Internacional contra a Homofobia, é importante fazer um repasso em todas as conquistas legais dos últimos anos quando se fala em direitos LGBT no Brasil. Adoção por casais homoafetivos, união estável, pensão por morte do companheiro e uso do nome social são apenas algumas delas.

Mas nem tudo são avanços: ainda há repetidos casos de violações dos direitos de gays, lésbicas, bissexuais, transexuais e travestis. O Brasil sustenta um grave quadro de violência homofóbica, algo que vemos periodicamente nas notícias de agressões físicas, perseguições nas ruas, discriminações e violência verbal. Mas há um índice ainda mais alarmante: somos o país que mais mata travestis e transexuais em todo o mundo.

Os dados são da organização não governamental alemã Transgender Europe, que contabilizou os registros entre janeiro de 2008 e dezembro de 2015. Durante esse período, foram documentadas 802 mortes no país, quase 40% dos casos reportados em todo o mundo. O Grupo Gay da Bahia, a mais antiga organização de defesa dos direitos gays em atividade, contabiliza, somente nos quatro primeiros meses de 2016, mais de 100 mortes por LGBTfobia.

Diante de um panorama assim, quais são os maiores desafios jurídicos? Alguns especialistas dizem que a falta de leis específicas para a criminalização da homofobia no Brasil dificulta o combate ao preconceito.

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À espera de aprovação

As iniciativas legislativas mais importantes nessa área são os projetos de lei PL 122/2006 e PL 7582/2014. O primeiro, também conhecido como lei anti-homofobia, foi arquivado após uma espera de 8 anos no Senado, sem que houvesse aprovação, nem mesmo parcial, do texto.

A intenção do PL 122, apresentado pela então deputada Iara Bernardi (PT) era alterar a Lei do Racismo (Lei 7716/89), colocando o preconceito motivado por identidade de gênero ou orientação sexual no mesmo nível dos demais preconceitos: raça, etnia, cor, procedência nacional ou religião.

Em 2014, a deputada Maria do Rosário (PT) enviou um substituto ao projeto arquivado, que se encontra em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. O PL 7582/2014, além do combate à homofobia, visa a criação de agravantes por crimes de preconceito, ódio e intolerância.

No mês passado, a criminalização da violência contra LGBTs foi tema da Conferência Nacional de Políticas Públicas de LGBT. O encontro evidenciou que há muitas propostas, porém o Brasil ainda está longe de um avanço significativo nessa temática.

Formado em Direito e defensor ativo da causa, Danilo Morais lembra que a atuação do Legislativo não deixa de reforçar a marginalização político-jurídica dos LGBTs, apesar de a Constituição pregar como objetivo fundamental promover o bem de todos sem preconceitos de qualquer natureza.

"Andou bem o STF ao reforçar a vocação contramajoritária dos direitos fundamentais, reconhecendo a legitimidade das uniões estáveis homoafetivas e, por conseguinte, de todos os direitos delas decorrentes, como os previdenciários ou patrimoniais. Entretanto, a construção dos direitos através da judicialização da política, embora pavimentem e iluminem o longo caminho para a cidadania LGBT, ainda deixa muitas lacunas e fraturas expostas da violência de gênero, notadamente no que diz respeito às travestis e aos transgêneros: há muito o que se percorrer!"

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A evolução dos direitos

Para a comunidade LGBT, o acesso a direitos está permeado por luta, tanto social como judicial. Nos últimos dez anos, houve avanços em questões importantes.

  • União estável

Desde 2011, as uniões entre casais homossexuais são reconhecidas e têm os mesmos direitos que as heterossexuais. A decisão, aprovada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por unanimidade, permite a gays e lésbicas terem acesso a pensões (alimentícia e por morte) e heranças, além de poderem constar como dependentes na Previdência e em planos de saúde, por exemplo.

Porém ainda há uma lacuna: como, no momento da votação, o STF não determinou o alcance da decisão, nem seus limites, ainda é passível de contestação judicial questões relacionadas a casamento civil gay, por exemplo. Para Danilo Morais, ainda assim, é uma grande vitória.

"Reconhecer como legítimas as uniões de pessoas do mesmo sexo implica, em última análise, reconhecer a igualdade entre os sujeitos e visibilizá-los em a toda a sua pluralidade. As futuras gerações terão contato com uma construção familiar mais humanizada, que valoriza a diversidade em vez de exterminá-la", comenta Danilo, lembrando que a democracia não é monopólio das instituições majoritárias, por isso todas as instituições que são funcionais à democracia são igualmente democráticas.

  • Adoção por casais homoafetivos

A adoção de uma criança na que ambos os parceiros constem no registro é possível e há precedentes jurídicos desde 2010. Porém, ainda não pode ser vista como um direito adquirido, já que se trata de outra lacuna deixada pelo STF.

  • Cirurgia de redesignação do sexo

A cirurgia de mudança de sexo pelo Sistema Único de Saúde (SUS) já é um direito adquirido desde 2008. A pessoa pode solicitá-la nos postos de saúde, o que abre um processo de preparação para a transgenitalização que durará dois anos.

Durante esse tempo, o paciente receberá acompanhamento psicológico, para respaldar sua decisão.

  • Nome social

Transexuais e travestis que são servidores públicos federais já podem utilizar seu nome social em todas as funções relacionadas com seu trabalho: crachás, e-mails, lista de ramais, prontuários, formulários, etc. O direito de ser reconhecido por sua identidade de gênero foi garantido por decreto presidencial, no mês passado.

Também há outras iniciativas isoladas em administrações públicas estaduais e municipais, além escolas e unidades de assistência social. Tal direito, porém, não é estendido a toda a comunidade LGBT.

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A urgência de uma educação inclusiva

Se os atos homofóbicos vêm se multiplicando pelo Brasil, também se expande a mobilização LGBT, atuando em duas frentes, nas ruas e nos tribunais.

"Os dois espaços estão invariavelmente contaminados pelos valores ou desvalores de uma sociedade: a lei não dita o Direito, mas a sua interpretação e aplicação, sim!"

Ainda conforme Danilo Morais, os tribunais têm mostrado à opinião pública que não são uma engrenagem puramente técnica ou um lugar asséptico às mensagens dos espaços públicos.

"Nesse sentido, as duas frentes são complementares. As Cortes não darão conta de todo o processo, mas agem como gatilhos importantes nesse processo político de reconhecimento da diversidade."

As conquistas da comunidade LGBT estão ligadas, estreitamente, à sociedade como um todo. Por isso, uma das reivindicações mais urgentes é viabilizar uma educação inclusiva, já que o novo processo, com espaço para a diversidade, permitiria atenuar de forma progressiva a discriminação, especialmente a de índole homofóbica.

"Ter acesso a uma educação inclusiva, que promova o respeito à dversidade sexual e à dignidade da pessoa humana diz respeito a todos e não apenas à comunidade LGBT. Os demais direitos seriam consequência espontânea dessa medida", alenta Danilo.

Fotos (ordem de aparição): por MundoAdvogados.com.br e °]°(Flickr)

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